quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Segundo


Du, quem te escreve é seu pai de 31 anos, provavelmente você não conhece essa minha versão e sim um coroa grisalho, com problemas no joelho e coluna bem mais atenuantes que hoje, com opinões muito formada sobre coisas que pouco vivência, recolido em casa e em sua rotina. Mas eu fui sim cool, subversivo, e inquieto. Entre militâncias, desobediências e viagens. Tudo num passado que você nunca viu.
E quando teu irmão nasceu me veio uma vontade aguda de escrever sobre tudo isso. Quem eu fui, por onde andei, que pessoas encontrei. Acho que bateu um medo de me resumir a um pai mundano. Queria lhe dar de presente um pai dono do mundo. Porém, meu mundo se compactou em nossa familia. Mergulhei em meio a fraldas, choros, ganhos pão e aprender a dirigir. Não escrevi nada por anos. Por tempo nem escrever lista de mercado eu escrevia. Percebi então, que quem eu era estava, de fato, ficando para trás. Não conseguia mais acompanhar as noticias, não conseguia ver filmes, nada. Deixei tudo que pude para ter tempo de ser pai. Não podia repetir a ausência de meu pai. E que ótima escolha fiz.
No resto, fiz a melhor que podia no momento. Tentei tomar a melhor decisão que pude. E assim você nasceu na terra de sua mãe. E assim sua criação foi um resultado do que experimentamos com a edução do Theo. Quando você chegou já encontrou uma pessoa mais encontrada, mas não com menos questões. Sabe filho, ser responsável por outras vidas me tirou dos eixos, de repente precisava prover uma qualidade de vida melhor do que a provia para mim mesmo pra toda uma galera. O medo de errar me fez ir pra onde sabia que ia acertar. Deixei pelo caminho o arriscado. O resto era dar amor e paciência (não que consiga sempre).
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Mas errar faz parte, não saber o que fazer também. Pensei no banho ontem, o que de mais importante queria proporcionar pra vocês dois, qual mensagem poética deveria deixar nesse texto. E meio chapado de baixo d´agua desejei que mais do que conhecer meu passado queria que vocês tivessem experiências parecidas. Corra riscos meu filho, de todos os tipos. Na premissa de que não saber de nada, vá atrás de saber, ver e interagir. E isso demanda riscos, sempre. E por favor nem adianta esfregar essas palavras na cara do seu pai grisalho. É meu trabalho temer as inconsequencias da juventude, trazer para a balança outros pesos. e posso me perder nessas preocupações, mas no passado arrisquei, me expus, cometi ilegalizadades, experimentei a liberdade. Quis mudar o mundo. E tudo isso me levou exatamente aonde estou hoje, me fez dar ao mundo o que de melhor poderia, vocês. E a vocês dei o melhor que tinha de mim, a liberdade e a coragem. Vai filho, devora a vida e mude seu mundo.

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Nós


Percebemos hoje onde estávamos ontem
Redescobrimos quem somos
Nunca sozinhos porém juntos
Nosso papel sem roteiro
Nossas horas extras de novas responsabilidades
Quase não sobra tempo para os abraços carinhos e amizade
Mas toda noite antes de dormir sentamos
Nos entrelaçamos 
Nos perdemos
Tentando entender onde estávamos hoje 
Não ontem
Temos receio do tempo perdido
Temos receio do tempo ser cíclico 
Mas como pode se não somos mais os mesmos
Temos receio de não lembrar mais como era
Temos receio de não acertar como será
Temos cansaço acumulado
Temos cegueira por estar olhando de muito perto
Temos receio de lembrar que não queríamos estar aqui

Nós
Fazemos tudo dobrado
Limpamos duas vezes
Arrumamos bagunça duas vezes
Explicamos que não bode bater milhares de vezes
Damos o almoço duas vezes
Fazemos o mundo engolir nossas escolhas duas vezes
Duas vezes mais amor
Nós amamos
Nos amamos
Somos uma família 

Nós somos tudo que temos 
Nós é tudo que nos faz feliz

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Rubia deu à luz às 23:41 do dia 25 de dezembro em uma sala hospitalar de parto humanizado. Porém, antes do teste de gravidez dar positivo eu nunca havia refletido sobre como gostaria que meu filho nascesse, homem não é levado à pensar nessas coisas, foi preciso Rubia me questionar sobre, chamar pra deitar na cama e ver um documentário sobre. E desde então foi pesquisa, leitura, filmes e, por fim, muita procura, pois precisávamos montar uma equipe (doula, médico obstetra e enfermeira obstetra) para realizar o parto que havíamos escolhido, o parto domiciliar.

Logo percebemos que entramos no meio de uma briga causada por diferenças de ideologia e extremismo. É equipe de enfermeiras que não gosta de médico. É médico que não gosta de doula. É doula que não gosta de tal médico. É enfermeira que não gosta de doula... E tudo que queríamos era apenas realizar um parto de acordo com nossas escolhas. Mas apesar de pesares, conseguimos mesmo assim montar uma equipe que nos deixou muito contentes. 
De início conhecemos uma doula que nos indicou outra pessoa, que nos indicou uma outra doula, tão jovem quanto nós e da mesma cidade. Rubia sentiu uma empatia imediata por ela. E eu também. Encontrar Camille foi nossa sorte em meio ao caos. Ela nos ajudou demais, sempre esteve disponível para dúvidas e medos, acrescentou informação e nos preparou para as mudanças de plano, porque planos sempre mudam. 
E o nosso mudou quando Rubia decidiu fazer um exame para detectar a bactéria streptococcus, uma amiga havia perdido o bebê por infecção ao passar pelo canal vaginal. Um caso raro, como ficamos sabendo mais tarde, e o exame nem é considerado obrigatório por alguns médicos, mas Rúbia naturalmente estava insegura. Ficou ainda mais quando saiu o resultado positivo, enviou mensagens aflita para toda a equipe e a resposta da enfermeira foi um seco comunicado que ela não faria mais o parto domiciliar. Não quis explicar mais nada por telefone, e também não poderia nos encontrar nos dias seguintes, mas se quiséssemos tal encontro o mesmo seria cobrardo como consulta. Deixou Rubia grávida de 38 semanas sem onde parir e sem dar nenhuma explicação. Em outras palavras, a profissional que havíamos contratado para fazer um parto HUMANIZADO tratou o parto do nosso filho apenas como um negócio perdido. Quem de fato foi humano foi a médica, a classe tão demonizada pelas enfermeiras, que nos recebeu para um consulta grátis no mesmo dia e no dia seguinte. Explicou com calma tudo que aquele resultado significava e acalmou Rubia. De fato o parto teria que ser feito num hospital para poder administrar um antibiótico horas antes do nascimento. Escolhemos então fazer na sala de parto humanizado do hospital da cidade. 
Theo nasceu de 42 semanas e 3 dias. Esperamos um sagitariano do começo de Dezembro e recebemos um copricorniano natalino pregador de peças. Foi uma vitória conseguir aguardar tanto tempo à mais do previsto com a pressão da família e até de amigos. A sensação era de "nós contra o mundo". Alguns nos tratavam como jovens inconseqüentes, que colocam a vida do filho em risco, usando argumentos sem nenhum estudo, e outros nos caçavam diariamente para questionar o porque ele ainda não nasceu. Até que perto da semana 43 Rubia optou por induzir o parto com misoprostol, uma pílula local que amadurece o colo do útero e acelera a liberação dos hormônios que iniciam o trabalho de parto. Em menos de 4 horas começaram as contrações, fortes e tinham intervalos de apenas segundos, sem dar um momento de descanso. Rubia quis ficar a maior parte do tempo no chuveiro apoiada em mim. Perguntava se iria doer ainda mais, procurava sem sucesso uma melhor posição e chorava alegando que não aguentaria mais, que queria algum remédio. O trabalho de parto avançou tão rápido que eu achei que iria nascer ali mesmo no quarto, quando finalmente a médica chegou e fomos direto para a sala de parto humanizado já com 9cm de dilatação. 
Rubia relaxou um pouco na banheira e logo quis ir para a banqueta ficar de cócoras. Eu a segurava, lhe dizia palavras de apoio e observava ela se entregando para a dor, entrando na tal "partolândia". Tornando-se cada minuto mais um animal seguindo seu instinto para parir, gritando e chamando pelo filho. As contrações ficaram mais espaçadas e ela pode até cochilar entre uma e outra, guardando energia para a fase expulsiva. Meia hora depois Theo nasceu. Veio ao mundo com 3,070 quilos e 50 cm. Pequeno e choroso. Foram cinco horas ao total o trabalho de parto e tudo foi tão rápido que nem deu tempo de aplicar o antibiótico, porém no dia seguinte um teste de sangue revelou que ele não tinha infecção alguma. Repousou no peito da mãe até o cordão parar de pulsar, quando eu o cortei. Foi examinado pela pediatra, que constou uma mucosa muito espessa que ele não estava dando conta de eliminar sozinho, ela indicou aspiração. Eu e Rubia aceitamos e logo após ele veio ao meu colo pela primeira vez. Fixou o olhar no meu assim que ouviu minha voz, a reconheceu. E desde então a reconhece com o mesmo olhar relaxado.
O video que segue aqui é justamente da fase final do trabalho de parto na banqueta até o nascimento. Levamos duas câmeras na esperança de registrar o máximo possível, porém essa foi minha última preocupação naquele dia. Graças à Camille que tirou fotos com o celular e alcançou a gopro para filmar, nem teríamos esse registro. 

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Poderia tirar fotos. É rápido, basta apertar um botão, e não dói. Na dívida, para que forçar outra coisa se é o que sei fazer? Não era meu trabalho até ontem? Tiraria milhares das coisas que vejo pro aí. Cheia de cores e das belezas que vejo em cada canto dessa casa. Só para te mostrar como tudo era quando chegou ao mundo. Te exemplificar com um instante todo o movimento que a vida dá e não informa, eu te mostro… 
Seria mais fácil que escrever. Pois a muito tempo não atento mas bem que poderia tentar ao menos uma vez. Montar um diário. Lhe escrever a loucura que está, o tanto que mudou meus enquadramentos e ainda nem terminou a espera da gravidez. Assim que conseguisse ler iria saber dos dias de um casal novo engolido pela rotina de esperar dezembro. Contar o quanto tua mãe vive uma montanha russa hormonal, chora um momento e num instante está alegre dançando com você de parceiro. Contar do carro goiano que viajou até Niterói para ser furtado...
Até pensei em pintar. Com tinta, tela e jet. Cada sentimento, cada fato. Trazer cores para a vida de uma criança, incentivo para sujar as mãos e mudar o que tocar. A mesma má influência que arte trouxe para mim...
Devia fazer logo um filme. Lotar os cinemas para verem meu bebê nascido na banheira de casa. Colocar uma trilha sonora alternativa para dar o tom ativista. Chamaria de “ O nascimento não cabe num hospital”. Vai que fica bom como soa...

sábado, 25 de outubro de 2014

Vem guria que o sol ilumina,
invade pela janela se você não ganha o dia e de noite jah nos guia.
Sem pressa, cobrança ou falsa democracia.
Não há quem invente pecado que nos impeça.
Não há quem invente lei que nos governe.
Somos desgovernáveis
E vamos ganhando a rua, corações e calçadas.

Não faça essa cara, porque se tu não concorda,
teve a sorte de repousar em quem não tem dúvida.

terça-feira, 10 de junho de 2014

Acordou objetiva, 115 milímetros de teleobjetiva Subjetivo te abordei Pra dizer que já se foi o tempo De perder tempo Dar mole é tão plural Que singular é pegar firme

terça-feira, 15 de abril de 2014

Meados de dois mil e quatro

A maconha me salvou. Eu. Homem. Branco. De classe média. Fui salvo de me tornar um imbecil. Um desperdício de sentimentos. Digo isso porque, além das luzes brilhantes derivada dos canabinoides no globo ocular, a maconha me fez ver além, dos dezesseis pra cá a vida passou a ser diferente.
Ser maconheiro me tornou alvo de preconceitos e por esse único hábito fui inteiramente taxado por pessoas do meu convívio. enquanto outras entraram nele me dando exemplos concretos de que origem, idade, cor, sexo, tesão e vício não basta para definir ninguém. Ser maconheiro me criminalizou e me mostrou os reais motivos e intenções de se criminalizar alguém. Ser maconheiro me fez dialogar com vício o tempo inteiro, me fez me sentir livre dos males, me fez me sentir preso como um dependente. E eu vi isso refletido nos olhos de pinguços de bar, de cracudos, de todos os usuários.
A maconha me levou à favelas, a militância me fez voltar. A maconha me levou à delegacias. Fui fichado em uma, tomei tapa na cara em várias outras. A maconha me levou as ruas, a becos escuros para fumar e ao ativismo indo marchar.
Faz dez anos que traguei o primeiro baseado que me salvou. Da minha vidinha confortável de homem, branco de classe média. Achando que o problema são os outros.