Começou como uma casa de família no alto de Santa Teresa. O filho sumiu em 71, o pai morreu do coração e Dona Anita nunca mais foi a mesma. Sabia que os homens haviam levado Leandro, o torturado para entregar nomes e depois jogado ao mar. Ela agora ajudava amigos de seu filho ou qualquer pessoa que precise se esconder por um tempo dos militares. E fazia isso muito bem. Na casa de Dona Anita havia hora para dormir, divisão de tarefas e regras severas para garantir ausência de qualquer suspeita da existência de alguma outra alma viva naquela casa além de uma senhora viúva e o velho cachorro da família. Era a ditadora contra a ditadura e não havia um revolucionário que abria a boca para contestar, ainda mais sua eficiência.
Já era de comum quando um companheiro tinha a identidade revelada ligar primeiro para Dona Anita, codinome Rosangela, antes de procurar outro aparelho, muitas vezes nunca usado. Quando conquistada uma vaga era ordenado que se chegasse de madrugada, sem fazer barulho e pela portas do fundo. Pular com cuidado os companheiros durmindo no chão da sala e se encontrar com Dona Anita num quarto sem janelas para receber as instruções do lugar. Ninguém ali sabia o nome de ninguém, da onde veio, quando veio e quando vai. Só Dona Anita tinha essas informações.
O aparelho Rosangela com lotação máxima de quinze companheiros só caiu cinco anos depois, com a morte de Dona Anita por insuficiência respiratória. Sua doença nos pulmões se agravou ainda mais ficando trancada nesse quarto sem janelas ou ventilação e com a fumaça dos cigarros fumados dentro de sua casa. Mesmo com o limite de cinco cigarros por dia por pessoa. A casa foi tomada pelo governo municipal e foi leiloada pela metade do seu preço real para um senhor de classe média alta, que transformou o local em uma casa de show alternativa. Muito frenquentada hoje pelos filhos classe média dos subversivos.
Um comentário:
adorei.
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