Os pombos do parque não gostam de mim. Não se aproximam ou tentam incomodar. Simplesmente me ignoram. Também pode, pois tudo que tenho para oferecer a eles são guimbas de cigarro. Venho aqui todo dia para matar o tempo do almoço. Sem biscoito, salgado ou doce. Só o maço. E eles já começaram a cagar pra mim no segundo dia.
Eles não gostam de mim, mas eu gosto deles. São seres inteligentes, mais do que parecem. Como eu. Forçando a barra (para mim). Prefiro os malhados em branco e marrom, parecem mais europeus, mas os pretos tem aquele pescoço em verde/azul metálico que muda quando se movem e tem todo seu charme também. Não que isso seja de vital importância, porque o meu favorito é o Tony, que se destaca pelas calças de pena que veste até os dedos, feito calça boca de sino. Bem Tony Manero. Se bem que tem também um magricela que mais parece uma galinha despenada, chega a lhe faltar um dedo dos poucos que tem na pata direita, o que o faz andar como um barco balançando na maré. Ele é a verdadeira representação do que é ser um verdadeiro pombo, afinal que sorte há em nascer pombo? Não existe um lugar no mundo onde um pombo seja querido o bastante para ser exibido em zoológico. Ninguém compra alguma babaquice qualquer só para alimentá-los, como fazem com as girafas e os elefantes. Talvez só as velhinhas, mas esse grupo vive tendo baixa todos os dias. Deve ser complicado depender delas. De fato, os pombos vivem de migalhas, algumas duramente roubadas entre as pernas de quem está disposto a chutá-los por desgosto.
Então um dia levei um saco globo de polvilho para mim e para os pombos. Tentando ganhar suas amizades. Há algum tempo já começava a me perguntar se eu era tão fudido assim que nem dessa gentalha eu merecia a atenção. Resolvi fazer algo logo antes que aquilo passasse a ser um pensamento paranóico.
Para aquilo tudo soar menos humilhante, primeiro tentei me fazer de desinteressado e comi uns dois biscoitos sozinho. Mascando de fazer barulho. Nenhum deles se aproximou. Quando as migalhas acumularam no meu colo, as joguei todas no chão. Esse foi o melhor plano que tive para disfarçar minhas intenções. Mas nada. Continuavam sumidos. Parecia que alguma velhinha nova tinha aparecido no pedaço. Perdi as esperanças. Como ia competir com aqueles miolos de pão mergulhados no leite esquentando minutos antes de sair de casa? Covardia! As velhas mimam demais os pombos. E não dão sequer um pão cru pro morador de rua da esquina.
Não adiantava ficar ali que os pombos não viriam nunca. Mas antes que eu fosse embora, já haviam três ratos se revezando em sair do mato correndo pegar uma migalha e voltar. Não ficavam, mas pelo menos apareciam para comer alguma coisa, assim como alguns vizinhos, não todos, só os mais vagabundos e nenhuma mulher. E foi ai que a depressão me pegou de vez. Até pra fazer amizade com alguma peste urbana eu tenho que ser amigo logo do que nem voar pode?
4 comentários:
Quem sabe não se afastam com medo de serem queimados pelas cinzas do cigarro. Paciência, ganhar confiança de pombo leva tempo.
haha
mas quem quer ganhar a confiança de um pombo, né?
pobre personagem... (bom conto!)
Os pombos (ou ratos de asa), surgiram na época da modernização do rio de janeiro promovida pelo Pereira Passos. A fim de imitar o modelo parisiense, trouxeram pombos da Franceses para enfeitar nosso rio. Marina é cultura.
rsrsrsrs...afff... a sua auto estima anda meio "baixo-estima", heim?!!
Mas seu texto é ótimo. Dei muita risada. Vc é muito criativo e escreve muito bem.
Um bom domingo.
Beijos.
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