domingo, 16 de dezembro de 2012

Espelho

Meu espelho viciou no olho vermelho. Nem bem acordo, tiro a remela e ele me entrega. Estilhaçado assim não consegue ser de outro jeito. Reflete tudo que envelhece. O chão, os azulejos, a água parada, todo o banheiro. Eu até poderia sair fora daqui. Mas tenho um arpão atravessado na boca. Sou livre pra voar como uma aeromoça. Sou tempo vago sem força. Tenho um beijo preso na garganta, tenho os dentes fechando a boca. E na solidão sou só eu apodrecendo em frente ao espelho. Allen Ginsberg apodrecendo nu em pelo. Desse jeito. De um tumor qualquer. Num humor sem fé admiro a mim mesmo, admiro minha posse, admiro os filhos que fiz com muito gozo. Fiz mesmo que com muito nojo de toda essa putaria. Grana, cobiça, horário, preguiça, sabe? É a vida. Um branco drama. Os cabelos caem, as olheiras descem e todo o lamento da culpa nunca sai. Somos todos carrascos, somos opressão. Eu e todos nesse banheiro.
De olhos vermelhos.
Espelho.

Um comentário:

Fernanda Costantino disse...

vou comentar de novo pq nesse me vi ed olhos vermelhos do teu lado.