domingo, 18 de maio de 2008

Tudo começou com um saco de arroz

O inicio da escalada de um homem começa com o saco de arroz. Eu com os meus cabelos bem mais loiros de criança esperava o carro chegar em casa com as compras mensais do supermercado. Nem precisava alguém me chamar eu já estava lá pronto para ajudar a carregar as comprar para dentro de casa. E repito, tudo começou quando eu carreguei o saco de um quilo de arroz para dentro de casa. Naquele dia comecei a me impor como um homenzinho, principalmente para meu pai. Dês de que o mundo é mundo, homem que é homem é forte, faz o trabalho bruto, e pode acreditar, naquela época um quilo de arroz era bem mais pesado que um quilo hoje.
Eu poderia ter escrito um poema, feito um desenho foda para me impor como gente grande, mas isso tudo é bobagem, eu queria ser forte e meter medo nas crianças menores que eu. O que sempre foi bem difícil pra mim.
A segunda revolução foi o caixote de leite. Eram doze caixas de leite, cada uma com um litro. Imagina meu espanto quando mais tarde descobri que cada uma pesava um quilo. Eu havia pulado de um quilo de arroz para doze quilos de leite. Tem algo mais forte que isso? Não, não. Aquilo era minha auto afirmação máxima da época. O carro chegava, a porta mala se abria e o caixote sempre estava por baixo de tudo. Era uma afobação para ser eu que pegasse o caixote. Quando todas as sacolas leves sem graça haviam ido para dentro eu corria para pegar o caixote de leite. Carregava com as duas mãos, os pés entortando quase igual ao chaves, mas levava todo cheio de mim.
E nessa época eu já escrevia algumas bobagens de criança, fazia parodias de filmes e músicas que me impressionavam, alguns desenhos rabiscados e tirava notas altíssimas no colégio. Porém não mostrava a ninguém. Guardava as atenções para quando algo que necessitasse de força bruta aparecesse.
Os anos passaram e vieram os bujões de gás, garrafões de água, material de construção. Foi o meu auge quando passei a carregá-los como se carrega uma caixa de papelão vazia, pra cima e pra baixo. Nesta época alguns conflitos internos já haviam começado. “Pra que fazer isso?” e o pior, eu descobri que eu gostava de escrever...
Depois me restaram trabalhos caseiros. Como cortar a grama, lavar carros... Mas hoje cheguei à posição máxima. Não carrego mais as compras. Um menino passa a infância inteira tentando carregar coisas cada vez mais pesadas para não ter mais que carrega-las um dia. São raras as vezes que estou em casa para carregá-las e ainda não inventaram nenhum compra mais pesada que um bujão de gás.

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