Em questão de música sou eclético, mas acima de tudo roqueiro. Isso quer dizer que não sou egocêntrico de achar que só uma guitarra distorcida pode fazer música, mas não sou tapado o suficiente para ouvir qualquer coisa. Nada contra o axé da Claudinha ou o funk das mulheres frutas, sempre gostei de tomar morango ao leite. Mas isso é outra história...
Crescido nos anos 90 vi o rock morrer com o tiro na cabeça de Kurt Cobain e choraminguei junto com outros meninos perdidos não ter vivido os anos 60 e o Woodstock. Ah! Aquele palco no meio do um grande gramado e milhares de pessoas ali respirando música, pregando a bondade e se alimentando de narcóticos para que isso não se torne uma reunião de mela cueca e sim um ato “libertador”. Seja lá que diferença isso tenha.
A solução me veio num flyer da Chemical. Uma rave, Claro! O Woodstock da minha geração é eletrônica. Eu tinha que conferir isso. Não demorei a me infiltrar num grupo de ratos de rave, alugamos uma van para ir, comprarmos os ingressos e todo o resto do “kit rave”. Só nisso morri em 100 reais. Os tempos mudam mesmo.
Preparei-me todo no dia, vesti roupas confortáveis, dormi e comi bastante. Calibrei o corpo antes de entrar na van e parti rumo aos anos 60. Logo na entrada perdi meus cigarros, a revista foi rigorosa e eu não pude entrar com um maço já aberto, só se ele tivesse ainda fechado. Bati boca com o segurança o suficiente pra levar um tapa na orelha e entrar revoltado na rave. “Preciso me acalmar, vou fumar um cigarro... Doh!” O maço lá dentro era dez reais. Por esse preço eu poderia comprar uma esposa na Arábia Saudita. Não demorei pra entender porque o apelido de seguranças de rave é “onda errada”. Usa terno, fala grosso e tem um trabalho contraditório. É como querer proibir o bolo de entrar na festa de aniversário.
E que festa! Os organizadores podem ganhar uma grana preta fazendo raves, mas eles sabem dar ao povo o que o povo gosto. “Pão e circo”. As luzes do lugar são hipnotizantes, todos ganham balão de hélio e o céu se enche deles. A música toma o lugar todo, sem parar por doze horas. A batida do subwoofer treme o corpo inteiro, a garganta vibra junto, chega a ficar difícil respirar. Virando de costas para o palco chega a sentir que o som faz massagem. É a prova da música contemporânea, que desconstruí o som. Não mais se ouve, se sente a música. Pois a batida é tocada numa freqüência inaudível para a audição humana.
Chegando as três da manha já me sentia exausto, com dores de tanto a música me obrigar a dançar. (Acredite, ela te obriga mesmo.) Não acreditava que fosse agüentar mais. Parei para um lanche. E comecei a reparar nas pessoas. É impressionante como todo mundo tem a mania te tatuar a própria graça no corpo. Conhecia metade da rave pelo nome. É são pessoas de todos os tipos, mas todos mesmo. Havia uma filho de fazendeiro cheio de ouro com chapéu de cowboy que não conseguia parar de sorrir e balançar sua jóias. Também havia um índio, sem camisa e com colar de sementes e tudo. Além dos habituais estereótipos de freqüentadores de raves. Gays, héteros, pan, todos morcegos de óculos escuros e alterados quimicamente, seja ela legalizada ou não.
Entretanto só quando amanheceu parece que a magia woodstockana começou, para a minha felicidade. O gramado verde se revelou, as pessoas receberam rosto e todo mundo começou a interagir. Cuidado com a maldade dessa frase. Era uma amizade só, todos sorriam para todos, trocavam de brinquedos de rave (aquelas bolas, bastões e etc. que também usam em sinais de transito para conseguir uma esmola) e se reabasteciam de inspiração. Contagiada pelo ambiente uma garota veio me elogiar e eu não puder dar outra resposta: “Preciso ser sincero com você, eu não vou parecer tão interessante quando você estiver sóbria.”.
Deitados na grama, fumando um cigarro e curtindo o sol, o grupo decide que já é hora de ir embora, passava das dez e a van nos esperava para voltar. E assim, totalmente destruído, tendo dançando 12 horas, comido só um hambúrguer e gasto mais de 200 reais, volto para a realidade sóbria. E agora José?
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