Eu tive uma vez uma euforia. Tive, porque agora não a tenho mais. ela me deixou faz hoje semanas. Fugiu por aquelas frestas que o olho nu não consegue ver, aqueles misteriosos furos por onde saem a inspiração molhada de suor. A euforia foi embora sem deixar um bilhete, sua parte no aluguel e os livros que eu ainda não terminei de ler.
E hoje tenho uma solidão. Tenho, porque hoje ela mora no meu bolso ou presa entre os dentes como um fiapo de carne que não consigo tirar com a língua. Ela não sai e eu não cutuco. Ela não fala e eu não pergunto. Não pergunto pois temo saber a verdade. Talvez seja que nunca tenha se sentido minha. Talvez sejam todas uma rapida euforia. E hoje estou tão ás sós.
Só, só pelas horas intermináveis que vivo, tenho tido tempo para cuidar dela. Minha solidão me deixou apegado a ela. Criatura deliciosamente argilosa. Presente e cheirosa. Temo que já não saiba viver sem.
Porém toda noite alguém bate na porta. Tomara que seja a euforia de volta, tomara que seja fácil viver junto depois da outra. A solidão se um dia ei de me deixar, com certeza deixaria um bilhete, dizendo que me espera quando toda essa bobagem passar, dizendo que sei aonde lhe encontrar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário